E se o lixo que bóia nos mares pudesse dar origem a móveis ecofriendly, feitos com o plástico marinho reciclado?
Não sei você, mas eu sempre achei que o plástico que poluía o mar era formado principalmente por garrafas, sacolas, canudinhos e outros descartáveis que a gente consome no dia a dia. Só que recentemente pesquisei um pouco mais e descobri que os restos de material de pesca (como redes e cabos) são 46% do total desse lixo. Eu sabia, claro, desse problema, mas não imaginava que era uma parte tão significativa do lixo plástico nos oceanos. O polipropileno é o plástico mais comum neste contexto e se decompõe rapidamente quando exposto ao sol, deixando pequenos pedaços de plástico que são lançados no meio ambiente.
Se continuarmos nesse ritmo, até 2050 vai ter mais plástico do que peixes no oceano (o dado é da Ellen McArthur Foundation, que tem como missão promover e desenvolver a economia circular). Isso tudo pra dizer que, além de revermos nossos hábitos em relação aos plásticos descartáveis, precisamos também considerar seriamente a questão das redes de pesca que vagam oceano afora.
E o design com isso?
Claro que o papel do design (e do designer) vai muito além de buscar dar um novo uso aos resíduos que já existem. Antes de mais nada, é preciso projetar de uma forma a não criar tanto lixo. Ainda segundo a Ellen MacArthur Foundation, “o lixo e a poluição não são acidentes, mas consequências de decisões tomadas na fase de projeto, onde são determinados cerca de 80% dos impactos ambientais. Ao mudar nossa mentalidade para ver os resíduos como uma falha de design e aproveitar novos materiais e tecnologias, podemos evitar a criação de mais lixo e poluição”.
De qualquer modo, o uso de redes de pesca (reutilizadas ou recicladas) na criação de mobiliário é uma iniciativa muito bacana, e reuni aqui sete exemplos de móveis feitos com plástico marinho reciclado que, além da atitude ecológica, atraem também pelo resultado estético.
Mesa e cadeira Ocean (1955), design Joergen e Nanna Ditzel, da Mater
Originalmente projetada em 1955, a mesa e a cadeira Ocean agora ressurgem pela dinamarquesa Mater em versão ecofriendly (cada uma usa 960g de plástico marinho, além de outros tipos de plástico reciclado). A série é caracterizada por sua estrutura leve com ripas de plástico reciclado e estrutura de aço – tudo testado para uso em espaços abertos. Outro ponto importante na busca pela sustentabilidade: “a coleção Ocean foi projetada para desmontagem, o que significa que o design permite que cada componente em sua forma mais pura seja reciclado em novos círculos de produção”, informa a dinamarquesa Mater.
Cadeira Svartskär (2014), design Hampus Penttinen
Conheci essa cadeira na mostra Un-desirables, um projeto experimental da Escola de Design e Artesanato da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, apresentado durante a Milan Design Week 2014. Os então alunos lançavam novo olhar sobre materiais rejeitados (ou indesejados, como o nome aponta) e criavam peças a serem produzidas em pequena escala. Diferentemente dos outros móveis mostrados nesse post, a cadeira de Hampus Penttinen utiliza a corda em si, tramando-a (e não transformando a corda em pellets de plástico para depois reciclá-la). “A corda que usei vem da costa do único parque nacional marinho da Suécia, o Kosterhavet”, conta ele.
Mesa Gyro (2016), design Brodie Neill
O tampo da mesa Gyro é feito com Ocean Terrazzo, um material inovador produzido com fragmentos de resíduos plásticos recolhidos do oceano. Em vários tons de azul e verde, o compósito é disposto de modo a formar um degradê caleidoscópico para representar as linhas longitudinais e latitudinais da Terra. Para desenvolver o Ocean Terrazzo (apresentado pela 1ª vez em 2016, na Bienal de Design de Londres), Brodie Neill colaborou com uma rede internacional de cientistas, pesquisadores, especialistas em meio ambiente, catadores de praia, engenheiros, artesãos e fabricantes para coletar e reconstituir pequenos fragmentos de plástico encontrados nos mares ao redor do globo.
Cadeira Nassau DuraOcean (2019), da Lifestyle Garden
Cada cadeira Nassau, produzida pela empresa Lifestyle Garden usando DuraOcean®, utiliza 3,5 quilos de lixo recolhido dos oceanos – até o momento, o DuraOcean® já deu novo destino a mais de 150 mil kgs de resíduos de lixo plástico marinho, a maior parte são cordas e redes de pesca. A base da cadeira é feita de eucalipto com certificação FSC.
Cadeira S-1500 (2020), design Snøhetta para Nordic Comfort Products (NCP)
A S-1500 é um redesenho estrutural da cadeira R-48, um clássico do modernismo norueguês criado por Bendt Winge do final dos anos 60 (só na Noruega, sua linha de cadeiras da série R para escolas e escritórios vendeu mais de 5 milhões de unidades).
Além de ser uma cadeira empilhável, versátil e resistente, o mais bacana da S-1500 é o fato de ela ser totalmente feita de material reciclado. O corpo é injetado com plástico 100% vindo de redes de pesca e cabos da indústria local de criação de peixes, enquanto a estrutura é de aço reciclado — as empresas locais de cultivo de peixes fornecem à NCP redes de pesca, cordas e tubos gastos de suas operações.
Há várias cores disponíveis, mas é importante notar que, embora a cadeira seja produzida em massa, o padrão visual de cada cadeira será único, em função de sua técnica de produção e composições plásticas variadas.
Banco Coast (2021), design Allan Hagerup para Vestre
Feito com lixo plástico recolhido por voluntários das praias da Noruega, o banco Coast é o resultado de uma parceria entre a empresa de mobiliário urbano Vestre e a iniciativa ambiental Ogoori. Com desenho simples, ele foi pensado para resistir ao uso ao ar livre em ambientes marinhos – uma alusão à origem do plástico e, por consequência, à economia circular. A estrutura de aço galvanizado recebe diversas “ripas” de plástico reciclado, que podem ser substituídas individualmente se for necessário. O banco ainda é um protótipo, mas a Vestre espera lançá-lo em edição limitada no final deste ano, após uma série de testes para avaliar a toxicidade do material e sua degradação pelos raios ultravioleta.
Cadeira Noho Move (2021), design Richard Shirtcliffe para Noho
A Noho Move é feita quase totalmente com Econyl®, um náilon regenerado, 100% fabricado com redes de pesca recicladas e carpetes no fim da vida. Para prolongar a vida útil da cadeira, foi acrescentada uma pequena porcentagem de fibra de vidro, dando mais resistência e durabilidade. O componente flexível da concha, por sua vez, é feito de polipropileno reciclado moldado – a estrutura da concha, que lembra uma malha, permite a flexão em quatro direções, conforme o movimento do corpo: a ideia é responder intuitivamente a todas as atividades e posturas, eliminando pontos de pressão e melhorando a circulação do corpo.
(Fotos: divulgação)