“Quando eu era jovem, só ouvíamos falar de funcionalismo, funcionalismo, funcionalismo. Não basta: o design também deve ser sensual e emocionante”, disse certa vez o designer italiano Ettore Sottsass Jr., um dos grandes nomes do design pós-moderno mundial. Esse pensamento está materializado na Valentine, projetada por Sottsass com a colaboração do inglês Perry King em 1968: uma máquina vermelha e reluzente, de forte estética pop, e que em nada lembrava os equipamentos de escritório da época.
Lançada pela Olivetti em 1969, dois anos depois a Valentine já fazia parte da coleção permanente do MoMA de Nova York. E até hoje, mais de 50 anos depois do seu lançamento, ela continua a ser um ícone do design, despertando o interesse de colecionadores e pessoas comuns (meu caso). Mas qual o motivo de tanto sucesso?
A ideia de Sottsass era que a Valentine, portátil que era, fosse vista como uma ferramenta cotidiana, tal qual um lápis, uma caneta esferográfica ou algo do gênero. “Ela foi inventada para uso em qualquer lugar, exceto num escritório, não para lembrar ninguém de monótonas horas de trabalho, mas sim para fazer companhia a poetas amadores em domingos tranquilos no campo ou para proporcionar um objeto altamente colorido sobre a mesa em um apartamento”, declarou o designer.
Ao focar o design tanto na conexão emocional com os usuários quanto na praticidade de uso, Sottsass conseguiu uma proeza: transcender a mesmice do design das máquinas de escrever da época e dar à Valentine um visual amigável e, principalmente, uma personalidade. Tão ou mais importante do que a performance do produto, era como ele fazia o usuário se sentir.
Mas o aspecto construtivo também trazia inovações: ela era feita em plástico ABS, o que a tornava leve e fácil de carregar. “Seu estojo é um ‘balde’ no qual a máquina é colocada e a alça não está presa ao ‘balde’, mas à máquina; então se transporta a máquina com o balde acoplado e isso simplifica as coisas”, descrevia uma matéria publicada na revista italiana Domus no ano do lançamento.
Apesar de também ter sido fabricada em branco, verde e azul, foi o vermelho que celebrizou a Valentine. Esta imagem icônica foi reforçada pelas campanhas publicitárias criadas para ela – o pôster idealizado pelo próprio Sottsass, em branco com fundo vermelho, provavelmente é o mais famoso.
O que torna a Valentine tão especial é o fato de ter sido criada por um designer tendo em mente a natureza emocional da relação entre as pessoas e as coisas que elas usam todos os dias. Sottsass “se dera conta de que equipamentos domésticos podiam ser domesticados. Uma máquina de escrever não precisava ser tratada como peça de maquinário anônimo, mas podia ser considerada dona de uma personalidade própria”, escreveu Deyan Sudjic em seu livro A linguagem das coisas.
Uma curiosidade: apesar de seu sucesso conceitual e de ter se tornado um ícone do design, a Valentine não teve o sucesso comercial esperado – ao que tudo indica, o preço era muito alto e a tecnologia logo viria a ser superada. No entanto, ela pode ser considerada uma precursora daquilo que Jonathan Ive e a Apple fizeram no final dos anos 1990, com o lançamento dos coloridos iMacs: quebrar a monotonia dos equipamentos de escritório e torná-los mais amigáveis.