Em outubro de 2023, a arquiteta Flávia Paes Lourenção, brasileira radicada em Milão, fez uma visita especialíssima à Vitra Haus – sede da Vitra em Weil am Rhein, cidadezinha alemã quase na fronteira com a Suíça – para conferir pessoalmente uma novidade que é um passo importante rumo à sustentabilidade. Eis que, finalmente terminado o embargo da notícia, agora podemos divulgar todos os detalhes que Flávia nos conta a seguir.
A partir de agora, quando algum alemão for descartar o lixo de sua casa, pode estar contribuindo involuntariamente para a história do design. Isso porque a partir de fevereiro desse ano o assento das cadeiras Eames Plastic Chair, ícones indiscutíveis do design, passaram a ser produzidos exclusivamente a partir do plástico reciclado proveniente da reciclagem de lixo doméstico da Alemanha. O ‘Gelber Sack’ é uma das divisões de coleta seletiva obrigatória nas residências alemãs e é constituído principalmente por embalagens. A Vitra agora pega os resíduos provenientes do Gelber Sack e os transforma no assento das cadeiras, gerando a nova Eames Plastic Chair RE. O emprego dessa matéria-prima diminui as emissões danosas ao meio ambiente e reduz drasticamente o consumo de energia primária. Charles e Ray Eames, os designers que desenharam a peça entre os finais dos anos 1940 e início dos 1950, certamente estariam felizes com essa decisão.
Como o assento da Eames Plastic Chair RE é formado a partir de embalagens plásticas recicladas de diferentes colorações unidas ao pigmento, o aspecto final da cadeira é formado por minúsculos pontinhos coloridos, visíveis com a aproximação do olhar. “Temos que nos acostumar com isso. Essa é a beleza da reutilização dos materiais!” comentou Christian Grosen, diretor de design da Vitra.
Pela impossibilidade de produção da cor branca a partir do material reciclado, a versão branca original da cadeira será a única que continuará a ser produzida com polipropileno virgem. Além das cores originais, a Eames Plastic Chair RE apresenta três novas cores de assento: branco ‘algodão’, amarelo ‘cedro’ e verde ‘esmeralda’.
A visita à Vitra tinha como objetivo apresentar a nova missão ambiental da marca suíça, parte de uma política de preocupação ecológica que a marca adota desde sua fundação em 1950 pelo empresário Willi Fehlbaum, e que a família abraçou como filosofia da empresa. Hoje, para contribuir com a sustentabilidade e diminuir o impacto ambiental de sua produção, são muitas as medidas tomadas pela Vitra: desde uma gestão muito rigorosa da logística, passando pela utilização de painéis fotovoltaicos para o aquecimento, a escolha de produtores locais como fornecedores de alguns dos componentes para seu móveis e objetos, a promoção da biodiversidade no Vitra Haus – que é um enorme campus arquitetônico, com edifícios projetados pelos mais famosos arquitetos mundiais em meio à natureza, um apiário e até uma horta –, além do incentivo à economia circular.
“A contribuição principal da Vitra à sustentabilidade está em seus próprios produtos, desenvolvidos sem elementos superficiais e com uma vida útil superior ao normal. As nossas raízes no design moderno não permitiriam nada diferente disso.” explicou Nora Felbhaum, CEO da Vitra e neta do fundador, durante a visita.
A ocasião também marcou a abertura da Vitra Circle Store dentro do Vitra Campus. Trata-se de um modelo de loja circular que a marca instituiu há três anos: os produtos à venda na loja provêm de showrooms, mostras ou clientes privados. Quando defeituosos, são primeiramente reparados por uma equipe especializada, para depois serem revendidos por valores mais baixos. Além disso, a loja conta com uma oficina para reparação na qual as pessoas podem trazer seus produtos Vitra ou enviá-los por correio para que sejam consertados.
A filosofia da marca (fabricar produtos atemporais e duradouros), juntamente com a preocupação com o meio ambiente, se encaixa perfeitamente nesse modelo de loja, na qual um produto encontra um novo proprietário ou uma nova destinação, sem que tenha que ir para o lixo, promovendo um consumo circular e consciente.
Circularidade, diminuição do impacto ambiental, conserto, nova utilização, sustentabilidade. Quando essas palavras encontram um sentido efetivo e se unem a um extremo bom gosto e estética refinada, é impossível não ficar encantado. E foi assim, maravilhada, que terminei a visita ao Vitra Campus naquela cinzenta tarde de outono.
(Fotos: divulgação Vitra)