Você provavelmente já ouviu falar da Bourse de Commerce, novo museu da Coleção Pinault em Paris. Localizado no centro da capital francesa, o edifício do século 18 (acima) reabriu ao público há alguns dias após um grande projeto de restauro e redesign encabeçado pelo arquiteto japonês Tadao Ando – marcado, principalmente, pela controversa inserção de um grande cilindro de concreto no interior de sua rotunda (abaixo).
Mas o tema desse post não é a arquitetura do novo museu, e sim as espetaculares luminárias criadas por Ronan e Erwan Bouroullec especialmente para esse projeto. Os irmãos franceses, tão habituados a projetar para produção em série, foram primorosos na concepção destas verdadeiras esculturas luminosas (fabricadas com a expertise de uma indústria – a italiana Flos –, mas totalmente site specific).
“Não precisávamos iluminar os espaços expositivos, mas sim as passagens. (…) Por isso, no desenho das luminárias, nos concentramos na sua relação com o que elas iluminam, mas também na presença cênica das mesmas quando não há luz artificial: durante o dia, quando os visitantes enchem o espaço”. As luminárias que povoam o hall de entrada e a escada foram, portanto, “pensadas e desenhadas para estarem ligadas, mas, sobretudo desligadas”, pontuam os designers.
Diálogo entre épocas
Intervenções contemporâneas em locais históricos costumam ser um desafio para os designers. Neste caso, o desafio encarado pelos Bouroullec foi duplo. De um lado, pelo caráter excepcional do lugar: com sua enorme cúpula de vidro, o imponente edifício histórico é um marco da capital francesa. Do outro lado, pela marcante arquitetura contemporânea com a qual o projeto dos irmãos iria interagir.
Assim, o diálogo com as arquiteturas (a antiga e a moderna) e a criação de uma atmosfera adequada para acompanhar o visitante na sua jornada de descoberta do edifício, de sua história e seus conteúdos foram fios condutores para o projeto dos Bouroullec para as instalações luminosas da Bolsa.
Espaços diversos, abordagens idem
Os Bouroullec criaram luminárias site specific para o hall de entrada, a escada monumental (dois espaços históricos) e o restaurante (um ambiente contemporâneo). Cada caso recebeu uma solução diferente – em comum entre elas, o aspecto linear das luminárias.
Para o hall de entrada, eles criaram a Horizontal Light, uma estrutura composta por cinco elementos tubulares de vidro e alumínio, com 6 metros de comprimento cada, posicionados paralelamente. Cada cilindro de vidro foi feito perto de Veneza com vidro fundido. “Não é um vidro técnico, mas um material que nunca é o mesmo, quase vivo, inserido em extrusões de alumínio. O resultado que pretendíamos alcançar era flutuante e vibrante, tal como o espaço que o acolhe”, explicam os Bouroullec. “Não tendo que lidar com as áreas técnicas, trabalhamos a sensualidade, a cor da luz e a forma como ela se relacionava com os detalhes da arquitetura de época”.
Na escada: monumentalidade e delicadeza
Se no hall de entrada a horizontalidade foi destacada, a magnífica escadaria C – formada por duas escadas em espiral que se cruzam – recebeu três imponentes Vertical Lights que, dispostas de forma triangular, percorrem o conjunto em toda sua altura (17 metros). As duas escadas laterais recebem as mesmas Vertical Lights suspensas, mas em número de cinco e conectadas em pentágono (acima).
“Para esses enormes lustres, escolhemos um processamento mais preciso para o vidro do que o da Horizontal Light. O alumínio que usamos também é mais delicado e fino: o vidro foi soprado com muito cuidado nos moldes e está protegido pela grade de metal para um efeito de concha”, contam os designers.
A possibilidade de o visitante se deslocar ao redor dos lustres permite apreciá-los sob múltiplos pontos de vista. “Observada de baixo, a instalação é delicada, quase transparente e etérea. À medida que se sobe, a sua presença física decisiva vai-se afirmando progressivamente”, analisam.
Linguagem de contrastes e simplicidade
Já no restaurante, de projeto totalmente contemporâneo, não existe o contraste com a arquitetura de época, mas Ronan e Erwan mantiveram vivo o diálogo entre os opostos. “Usamos em parte a Vertical Light, mas também montámos as mesas individuais com luminárias simples e simpáticas, que repousam sobre uma base de ferro forjado e funcionam com uma fonte de luz recarregável muito suave”.
O diálogo respeitoso e potente que os Bouroullec conseguiram estabelecer entre suas luminárias e os espaços arquitetônicos – e, principalmente, entre história e contemporaneidade – só faz aumentar minha admiração por essa dupla tão talentosa.
Fotos: Tommaso Sartori / divulgação Flos, Luca Caizzi/divulgação Flos e Studio Bouroullec / divulgação