Faye Toogood e o design contemporâneo que abraça o gênero, o lúdico e a multidisciplinaridade

Tempo de leitura: 6 minutos

Por Flávia Paes Lourenção*

“Eu me conecto com as pessoas por meio dos objetos.”
Faye Toogood

Faye Toogood em seu estúdio Toogood

Em abril do ano passado, quem visitou o estande da marca italiana Tacchini, no Salone del Mobile, teve certeza de admirar algo fresco e novo ao bater o olho nas criações da designer britânica Faye TooGood: objetos com uma elegância despretensiosa, conforto extremo e formas que pareciam saídas de qualquer lugar menos um – o lugar-comum.

Coleção Faye Toogood para Tacchini

Faye TooGood é hoje um dos nomes mais importantes no universo do design britânico. A chegada até aqui não foi fácil, especialmente porque quando começou a trabalhar com design de objetos, há cerca 20 anos, o mundo do design era prevalentemente masculino. “Quando comecei, decidi que lidaria somente com materiais que fossem essencialmente ‘masculinos’: aço, soldagem e materiais pesados. Decidi também remover qualquer tipo de decoração ou cor do meu trabalho: eu seria monocromática, porque eu realmente pensava que aquele era o único jeito de ser levada a sério” contou durante um talk na Maison&Objet, em janeiro deste ano.

Os anos trouxeram amadurecimento, uma aceitação de si mesma (provavelmente impulsionada pelo crescimento e a consequente aceitação das mulheres no mundo do design) e uma insistência em se fazer notar, fatores que foram fundamentais para chegar onde hoje se encontra. A designer continua usando materiais brutos em muitas de suas criações, mas sem renunciar às cores, decorações e a uma sensibilidade feminina que transparece em suas peças – e é justamente a união dessas características que trazem ao seu trabalho um caráter único e peculiar.

Escolhida como a designer do ano para a Maison&Objet 2025, maior feira de design da França que acontece a cada seis meses em Paris, Faye e seu estúdio TooGood, baseado em Londres, desenvolvem trabalhos multidisciplinares que transitam entre arte, moda e design. Tudo em perfeita sintonia com a mente e história de vida da menina que cresceu no interior da Inglaterra, se formou em História de Arte e foi Editora de Interiores da revista The World of Interiors por oito anos, até decidir que queria fazer coisas em três dimensões e não mais ficar somente no papel.

Esqueleto de madeira da Gummy Chair e um detalhe da poltrona

No início, seus projetos de design eram instalações efêmeras, até que um colega especial de nome Tom Dixon (bota especial nisso!) um dia a aconselhou a começar a fazer objetos permanentes. Para a nossa sorte, Faye seguiu o conselho. O sucesso no mundo do design chegou em 2014 com a poltrona Roly Poly, que hoje faz parte da coleção permanente de vários museus pelo mundo, tendo sido considerada um ícone do design da década passada, e hoje é produzida na Itália pela Driade. Desde então a designer não parou mais, e suas últimas colaborações incluem marcas como Poltrona Frau, cc-Tapis, Tacchini e Maison Matisse.

Poltrona Roly-Poly, 2014

Hoje, Faye tem consciência de que a multidisciplinaridade e o ato de flanar por vários campos de atuação são justamente o seu “superpoder”, como ela mesma definiu, e parou de se preocupar em ter que se inserir em uma “caixinha” específica como designer industrial ou artista ou decoradora, por exemplo.

Marca de roupas Toogood

Loja Mulberry – Regent Street

Mesa lateral Palette Skymore Sapphire, da Toogood

Tapetes desenhados para cc-Tapis

Na instalação ‘Womanifesto’, criada por ela durante a Maison&Objet 2025, Faye decidiu escancarar a sua mente criativa projetando quatro espaços bem definidos que representavam os pilares de seu estúdio: desenho, escultura, paisagem e material. Os espaços representam a mente inconsciente sonhadora do presente e do futuro de seu trabalho.

Espaços Desenho e Material, na instalação Womanifesto

Espaço Escultura, na instalação Womanifesto

Espaço Paisagem, na instalação Womanifesto

Partindo de um processo muito mais naive do que refinado, Faye conta que para iniciar a criação de um objeto ela procura não desenhar e evita usar o computador: inicia com poucos materiais básicos ao seu redor como tela, papel e arame, coisas que a permitem criar pequenas maquetes, em um processo similar ao de uma criança quando brinca. “E é essa qualidade lúdica que eu acredito que as pessoas vêem no meu trabalho, e é o que eu espero que as elas sintam quando elas olham para ele.”

Modelo e Poltrona Squash para Poltrona Frau

Biblioteca de materiais do estúdio Toogood

“O que estou me dando conta agora, nessa segunda fase do meu trabalho, é que provavelmente o meu papel seja conectar pessoas de um jeito mais profundo com a natureza e com a paisagem, porque eu sinto que essa é uma coisa que todos nós precisamos urgentemente. E eu farei isso com objetos naturais, materiais naturais e sensibilidade natural” conta, acrescentando que o design global hoje é um problema que os designers têm que enfrentar: “projetar no Reino Unido com um fabricante italiano para depois exportar para os Estados Unidos é um tipo de logística que deve mudar, porque não é sustentável.” Apesar de ter a consciência de não possuir a solução para esse problema, a designer trabalha com materiais locais, artesãos locais e evita o uso de processos químicos nocivos ao meio-ambiente.

Quais são os planos de Faye para o futuro? A designer pretende trabalhar com crianças e ajudá-las a navegar no mundo de hoje – que, segundo ela, é bastante problemático –, e, por que não, enfrentá-lo, talvez trabalhando com um projeto público. “Eu adoraria projetar um playground”, revela. Por aqui, esperaremos ansiosamente por um parquinho assinado Faye Toogood!

Flávia Paes Lourenção é arquiteta, brasileira, e reside em Milão. Colabora com o Design do Bom na cobertura de eventos internacionais.
Fotos: Divulgação

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