Surgido em um período difícil – a grave crise econômica que atingiu os Estados Unidos após o crack da bolsa de 1929 –, o streamlining foi um verdadeiro fenômeno naquele país. O estilo, caracterizado por linhas arredondadas que normalmente aludem à forma de uma gota, em geral aliada à presença de linhas horizontais e de elementos cromados, não apenas serviu ao fim que se propunha – alavancar as vendas durante o período de crise –, mas se superou. “Embora o estilo tenha tido seu auge nos anos 1930, 1940 e 1950, ele criou objetos que permaneceram por muito tempo, e inclusive desenhou e formulou tipologias que estão aí até hoje”, afirma Adélia Borges. Ao lado de Patrícia Fonseca, Adélia é curadora da exposição Design Aerodinâmico: metáfora do futuro, que abre hoje ao público no Museu da Casa Brasileira, em São Paulo.
Trata-se da primeira grande mostra sobre o assunto já realizada no Brasil. “Esse tema é bastante negligenciado em nosso país, porque aqui imperou, no ensino do design, a ideologia ulmiana [referindo-se à Escola de Ulm, na Alemanha]”, diz Adélia. “Desde os pós-modernos não existe mais essa ideia do ‘bom design’. O design segue a cultura, a forma segue a função, sim, mas também a emoção, também a diversão…”
A mostra reúne cerca de 300 peças que mostram a amplitude do streamlining, o qual se implantou em objetos das mais diversas tipologias e áreas: trens, aviões, carros, bicicletas, geladeiras, fogões, máquinas de lavar, ventiladores, ferros de passar, rádios, luminárias, apontadores de lápis… “É um estilo que se inicia nos transportes, e depois vai se ocupar dos eletrodomésticos – é o primeiro, na história do design, que vai trabalhar com eletrodomésticos. E vai ser por uma questão de marketing mesmo: os Estados Unidos precisavam alavancar as vendas dos produtos. E como você convence alguém a comprar? A aparência tem que vender tecnologia, eficiência… E era isso que eles faziam”, diz Patricia Fonseca.
Assim se explica a presença muito forte do cromado, oriundo das indústrias aérea e automobilística, e também das linhas aerodinâmicas e frisos presentes em todos os objetos, por mais diminutos que fossem – e por menor, ou inexistente, que fosse a necessidade técnica de uma forma aerodinâmica. “É a primeira vez que os objetos começam a ter uma forma que vai falar de simbolismo. Ela fala de eficiência, ela fala de sonhos, fala de um amanhã melhor”, completa Patrícia. Por isso, as linhas que remetem à velocidade vão migrar também para objetos tão prosaicos como garrafas térmicas, carrinhos de bebê, luminárias e ferros de passar, que, do ponto de vista estritamente funcional, em nada necessitam de uma forma aerodinâmica.
A exposição, que fica em cartaz até 3 de junho, é uma oportunidade e tanto para ver, de perto, peças que compõem o acervo de alguns dos mais importantes museus de design do mundo. Quase todas as peças fazem parte da coleção particular do fotógrafo italiano radicado no Brasil Giacomo Favretto. “Sempre fui apaixonado por esse estilo, [essa paixão] começou há quase 50 anos por uma questão estética. Depois fui me aprofundando e aí percebi, além da estética, a função psicológica: eu acho muito legal o fato de [o estilo] estar focado em cima de algo positivo, algo otimista”, conta o colecionador.
Dentre o universo exposto (cerca da metade do acervo de Favretto), destacam-se peças criadas por designers icônicos do streamlining, como Raymond Loewy, Norman Bel Geddes, Walter DorwinTeague e Henry Dreyfuss, mas também por outros nomes de relevo na história do design e da arquitetura, como Isamu Noguchi, Gio Ponti e Buckminster Fuller. Imperdível!!
A exposição Design aerodinâmico: metáfora do futuro tem patrocínio da Tok&Stok.